Por André Freitas e Gustavo Leite

 

A greve dos auditores fiscais pode impactar diretamente a expectativa de arrecadação do Governo Federal, que começou o ano com uma meta fiscal ousada, a ser cumprida.

A Câmara Superior do Carf adiou 55 casos que estavam na pauta da semana passada. Alguns desses processos envolvem valores vultosos.

Em novembro de 2023, o montante financeiro pendente de julgamento era de 1,155 trilhão de reais. Naturalmente não significa que o governo federal irá arrecadar o valor total citado, pois pode haver decisões administrativas favoráveis aos contribuintes, ou, caso as decisões do Carf sejam favoráveis à Fazenda, o contribuinte poderá recorrer ao Poder Judiciário.

Um dos casos que envolvem valor elevado trata da multa qualificada de 150%, que possui precedentes no Poder Judiciário e uma maturação, pelo Poder Judiciário, dos percentuais de multas tributárias aplicadas pelos Fiscos. Ou seja, este caso poderá parar na Justiça.

Esta paralisação impacta tanto o Fisco quanto os contribuintes.

Conforme a notícia do valor econômico¹: “o Carf era uma das apostas do governo federal para arrecadação em 2023. No fim do ano, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, afirmou, em coletiva de imprensa, que a volta do voto de qualidade ao Carf – o desempate pelo presidente da turma, representante da Fazenda – não gerou as receitas previstas, mas que teria impacto em 2024.” Aparentemente, “faltou combinar com o time da Rússia.”

Evidentemente o Governo Federal adotou outras medidas para cumprir a meta fiscal, podendo ser citada a MP n° 1.202/23 e a Lei n° 14.789/23.

Todavia, ambas têm sido objeto de ações judiciais, com decisões favoráveis aos contribuintes, afastando a aplicação das leis ao caso concreto dos contribuintes.

A greve se dá pelo fato de os auditores fiscais reivindicarem um bônus por produtividade no orçamento de 2024. Segundo matérias jornalísticas divulgadas à época do início da greve, os auditores tinham as suas remunerações, historicamente, mais altas que os procuradores. Pelo fato de a judicialização nos últimos anos ter sido volumosa, os procuradores passaram a ganhar mais, por causa dos honorários de sucumbência, valor não distribuído para os auditores, por pertencer exclusivamente aos litigantes de um processo judicial.

Em contrapartida, é direito dos contribuintes a duração razoável dos processos, conforme prevê o art. 5°, inciso LXXVIII da CF. Embora exista o enunciado da Súmula n° 11 do Carf: “não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal.”,  o STJ ao julgar o REsp nº 1.999.532/RJ, que tratava de multas decorrentes do registro no Sistema Siscomex-Exportação dos dados sobre mercadorias transportadas para o exterior, entendeu pela ocorrência da prescrição intercorrente, com fundamento no art. 1°, §1° da Lei n° 9.873/99. Embora este caso se trate de multa, há de se considerar que o enunciado da citada súmula não se coaduna com a previsão constitucional, e é inadmissível entender que o processo não tenha prazo para se encerrar, podendo se perpetuar no tempo.

Há, inclusive, entendimento exposto pelo advogado André Luiz Martins Freitas, entendendo que o prazo do processo administrativo deve ser o mesmo prazo para realização do lançamento, sob pena de ocorrência da decadência. Ou seja, haveria até uma impropriedade técnica na Súmula n° 11, já que ela diz prescrição, quando se trata de decadência. Veja-se um trecho:

“O prazo previsto no CTN para a realização do lançamento é de cinco anos. Assim, o prazo para o término do processo administrativo é também de cinco anos.

É comum processos administrativos fiscais, especialmente no âmbito federal, durarem mais de cinco anos, sendo que muitos costumam durar mais do que uma década.

Entendo que, no caso de todos os processos administrativos fiscais de exigência de crédito tributário que durarem mais do que cinco anos, ocorrerá a decadência do lançamento, com a consequente extinção do crédito tributário.”

 

No final das contas, a previsão do governo federal pode se dissociar com a realidade, tendo em vista que almejava arrecadar valores vultosos com os julgamentos do Carf, mas, com esta greve, poderá arrecadar muito menos, tendo em vista que os contribuintes, posteriormente, poderão discutir sobre a ocorrência de extinção do crédito tributário pela ocorrência de tempo superior ao previsto no CTN, legislações especiais e à duração razoável do processo, prevista na Constituição e no CPC.

 

Compartilhe esse artigo: