Imposição Inconstitucional de Apuração dos Valores de ICMS das Transportadoras de Cargas pelo Estado de Minas Gerais

     O Estado de Minas Gerais por meio do Decreto nº 43.080/02, que aprova o Regulamento do ICMS, em seu artigo 75, XXIX, “a”, determina que em substituição ao sistema normal de débito e crédito o prestador de serviço de transporte rodoviário de cargas gozará de um crédito presumido equivalente a 20% do valor do imposto devido na prestação. Ou seja, para que o contribuinte apure o valor do ICMS que terá que recolher, ele terá que abrir mão de seus créditos e fará jus ao crédito presumido.

     Pela redação do artigo acima mencionado, o Estado nem sequer faculta ao contribuinte entre esses sistemas de apuração do valor do ICMS. Pelo contrário, o contribuinte que quiser apurar o ICMS pelo sistema de débito e crédito, terá que formalizar o pedido mediante regime especial que será concedido pelo diretor da Superintendência de Tributação. Este regime estabelecerá obrigações acessórias, e, poderá ser deferido ou não.

     Várias transportadoras de cargas vem sendo autuadas pelo Fisco Estadual, pois elas apuram o ICMS pelo sistema de débito e crédito enquanto o Estado exige que elas apurem pelo sistema do crédito presumido.

     Essas transportadoras vêm tendo êxito em suas demandas judiciais que tratam desta matéria, pois há uma violação nítida da ordem constitucional feita pelo RICMS.

     A Constituição não dá aos Entes Federados amplos poderes para disciplinar o regime de apuração do ICMS. Estes poderão disciplinar a matéria sem transgredir a previsão constitucional.

     À toda evidência, todas as normas infraconstitucionais estão limitadas pela Constituição. Tudo que contrastar com a CF, será, consequentemente, inconstitucional. Portanto, a lei complementar, lei estadual e decretos não poderão alterar, restringir ou prejudicar a regra que a CF traz.

     Conforme se extrai do inciso I, §2°, art. 155, a Constituição concede o direito de compensação dos créditos gerados em operações anteriores, sem restrição, ou seja, não determina que para este sistema seja adotada medidas excepcionais, atípicas, especiais, e sim prevê que o curso natural da compensação se faça pelo regime de crédito e débito. Assim também é o previsto na Lei Kandir, que disciplina a matéria.

     Não há dúvidas que a previsão do regime de apuração do valor de ICMS pela sistemática do crédito presumido como regra, feita pelo RICMS/02, contrasta com a previsão da CF.

     Principalmente tendo em vista que o Estado de Minas Gerais exige uma série de requisitos para que o contribuinte possa “optar” pelo regime de apuração pela sistemática de compensação entre débitos e créditos, o que configura uma limitação à previsão da regra da não cumulação positivada na CF.

     A compensação entre débitos e créditos é a sistemática natural para o contribuinte apurar o valor do ICMS, o que não impede que sejam previstos outros meios de compensação, mas neste caso, a lei deverá colocar o meio alternativo como regra especial, contrário do que é feito pelo decreto, que inverteu esta lógica.  A imposição de qualquer outro método de apuração do valor do ICMS é a exceção, e não a regra.

    O Decreto Estadual nº 43.080/2002 (RICMS/2002), extrapola, e muito, sua competência de apenas regulamentar a Lei Tributária Estadual, e inverte uma lógica prevista na CF para apuração do ICMS, e define como regra o regime de crédito presumido.

    A sistemática que o Estado de Minas Gerais tenta impor às transportadoras de cargas transforma um direito à apuração do ICMS, garantido pela CF, pela Lei Complementar nº 87/96, que trata do ICMS em âmbito federal, e pela legislação tributária estadual, em um direito que depende de concessão de regime especial por parte do Fisco.

     As transportadoras de cargas que pretendem apurar o ICMS pelo regime de débito e crédito deverão buscar na via judicial este reconhecimento, que poderá ser feito por meio de um Mandado de Segurança preventivo. As empresas que já foram autuadas por apurarem o ICMS pelo regime normal de débito e crédito também podem se valer da via judicial para fazerem defesas.

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