Inconstitucionalidade do PLS 332/2018, que altera a Lei Kandir

Por Gustavo Leite

 

O Projeto de Lei do Senado n° 332/2018 teve a sua instrução concluída em 27/04/2022 e agora segue para votação.

Tal projeto visa positivar um entendimento jurisprudencial pacificado há anos, com a Súmula 166 do STJ, recursos julgados pelo rito dos recursos repetitivos, pelo STJ e pelo STF, e, recentemente, pelo julgamento em controle concentrado de constitucionalidade na ADC 49.

Pelas menções acima, o leitor já deve ter deduzido a matéria. Para quem não é familiarizado com os julgados, eles tratam da “não incidência de ICMS nas operações de saída de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular”.

O projeto visa alterar o artigo 12 da Lei Complementar 87/96, que passaria a ter a seguinte redação;

“Art. 12.

I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte;

(…)

  • 4º Não se considera ocorrido o fato gerador do imposto na saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte para outro estabelecimento de mesmo titular, mantendo-se integralmente o crédito tributário em favor do contribuinte que decorre desta operação.
  • 5º Alternativamente ao disposto no § 4º deste artigo, fica o contribuinte autorizado a fazer a incidência e o destaque do imposto na saída do seu estabelecimento para outro estabelecimento de mesmo titular, hipótese em que o imposto destacado na saída será considerado crédito tributário pelo estabelecimento destinatário. ”

Pela redação deste projeto, pode-se concluir que ele é inconstitucional.

Sabe-se que o ICMS é um imposto de competência estadual, previsto no art. 155, inciso II da Constituição da República Federativa do Brasil.

A Constituição, ao tratar das limitações ao poder de tributar, previu que a União não poderia conceder isenções sobre tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. Essa regra está prevista no art. 151, inciso I, da CF. Veja-se a previsão:

 

“Art. 151. É vedado à União:

(…)

III – instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.”

 

Trata-se da chamada isenção heterônoma.

Embora a intenção do Senado Federal, em um primeiro olhar, pareça normatizar a jurisprudência pacífica, ela acaba incorrendo em inconstitucionalidade.

Na lição de Paulo de Barros Carvalho, isenção é uma regra que inibe a “funcionalidade da regra-matriz tributária, comprometendo-a para certos casos”. Ou seja, uma regra de isenção mutila, parcialmente, “um ou mais critérios da norma-padrão de incidência”. Sem aprofundar em todos os critérios da norma de incidência trazidos pelo mencionado jurista, o PLS 332/2018 desqualifica as saídas de mercadorias de estabelecimento de determinado contribuinte para outro estabelecimento de mesmo titular. Pois, prescreve que tal operação específica não deverá ser considerada como fato gerador do ICMS.

Tal previsão mexe no critério material da hipótese normativa de incidência tributária, sendo caracterizada como isenção.

Portanto, caso o Projeto de Lei n° 332/2018 ingresse no ordenamento jurídico, ela estará eivada do vício da inconstitucionalidade. O que se pretende com este artigo é a provocação do debate sobre a melhor redação para positivar a jurisprudência pacificada pelos Tribunais Superiores, para que as discussões que tratam desta matéria, não perdurem eternamente, como já, há muito, se delongam nos tribunais.

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