O CONFLITO TERMINOLÓGIO EM RELAÇÃO A INSUMOS E O CRITÉRIO DA ESSENCIALIDADE E DA RELEVÂNCIA NA DETERMINAÇÃO DE CRÉDITOS DE PIS E COFINS

Iara Coimbra Teixeira

 

Conforme entendimento firmado em recurso julgado pelo rito dos recursos repetitivos pelo STJ, a determinação de quais insumos geram créditos de PIS e de Cofins no regime não cumulativo deve ser casuística, devendo ser adotado o critério da essencialidade e da relevância do insumo, e desde que este seja aplicado no processo produtivo da pessoa jurídica contribuinte.

Cabe, de início, destacar o modo como tem sido conceituado, na jurisprudência, “insumos” na legislação do imposto de renda. Em julgado recente do Carf, foi afastada a interpretação restritiva consolidada no âmbito do IPI e rejeitada a aplicação do conceito mais amplo de insumos, visto que o judiciário também tem entendido que cabe a relativização do conceito de insumos pela análise de cada caso específico.

É público e notório que o termo “insumo” possui o mesmo sentido e significado comum dentro de todo o território nacional, traduzindo cada um dos elementos, diretos e indiretos, necessários à produção de produtos e serviços. Contudo, há manifestações em que que alega, por exemplo, que o conceito de insumos relativos ao IPI, tem interpretação restritiva, além de ultrapassada, uma vez que não consta em lei e ainda fere o princípio da confiança, já que havia uma promessa de que os contribuintes poderiam creditar-se de toda despesa e todo custo necessários à sua produção e ao exercício de sua atividade, como argumentado em Acórdão n° 3202-000.226 do Carf.

A Secretaria da Receita Federal limitou, nas Instruções Normativas SRF n°s 247/2002 e 404/2004, o conceito de “insumos”. Essa restrição ressente-se do vício da ilegalidade, pelo fato de o poder regulamentador do Executivo estar adstrito apenas e tão somente a assegurar a execução das leis, não podendo os atos administrativos normativos de caráter secundário, inovar na ordem jurídica.

O conceito de insumos no âmbito do PIS/Pasep e Cofins, pressupõe que os bens ou serviços sejam consumidos durante o processo produtivo (ou de prestação de serviços) e dentro de seu espaço, salvo disposições legais expressas. É o que ocorre com as despesas com frete e armazenagem nas operações de comercialização, as quais se dão após o término do processo produtivo, mas geram direito a crédito de PIS/Pasep e da Cofins, em decorrência da previsão nas Leis n° 10.637/2002 e 10.833/2003.

Ensina Marco Aurélio Greco sobre o tema:

Por outro lado, nas contribuições, o §11 do artigo 195 da CF não fixa parâmetros para o desenho da não cumulatividade o que permite às Leis mencionadas adotarem a técnica de mandar calcular o crédito sobre o valor dos dispêndios feitos com a aquisição de bens e também de serviços tributados, mas não restringe o crédito ao montante cobrado anteriormente. Vale dizer, a não cumulatividade regulada pelas Leis não tem o mesmo perfil da pertinente ao IPI, pois a integração exigida é mais funcional do que apenas física.

Assim, por exemplo, no âmbito do IPI o referencial constitucional é um produto (objeto físico) e a ele deve ser reportada a relação funcional determinante do que poderá, ou não, ser considerado “insumo”. Por outro lado, no âmbito de PIS/COFINS a referência explícita é a “produção ou fabricação”, vale dizer às ATIVIDADES e PROCESSOS de produzir ou fabricar, de modo que a partir deste referencial deverá ser identificado o universo de bens e serviços reputados seus respectivos insumos.

Por isso, é indispensável ter em mente que, no âmbito tributário, o termo “insumo” não tem um sentido único; a sua amplitude e seu significado são definidos pelo contexto em que o termo é utilizado, pelas balizas  jurídico normativas a aplicar no âmbito de determinado imposto ou contribuição, e as conclusões pertinentes a um, não são automaticamente transplantáveis para outro.

(…)

No caso, estamos perante contribuições cujo pressuposto de fato é a receita ou o faturamento, portanto, sua não cumulatividade deve ser vista como técnica voltada a viabilizar a determinação do montante a recolher em função deles (receita/faturamento). Enquanto o processo formativo de um produto aponta no sentido de eventos a ele relativos, o processo formativo da receita ou do faturamento aponta na direção de todos os elementos (físicos ou funcionais) relevantes para sua obtenção. Vale dizer, por mais de urna razão, o universo de elementos captáveis pela não-cumulatividade de PIS/COFINS é mais amplo que o do IPI. (GRECO, Marco Aurélio. Conceito de Insumo à luz da legislação de PIS/COFINS. Revista I Fórum de Direito Tributário, v. 34, jul./ago. 2008.)

Em julgamento, o STJ relativizou o conceito, atribuindo a análise do caso concreto à responsabilidade por decidir sobre a essencialidade e a relevância, o que afastou o conceito restritivo de insumos enunciado pelas Instruções Normativas n° 247/2002 e 404/2004. Portanto, o STJ adotou uma concepção de insumos que é considerada intermediária, diferente daquelas acolhidas pela legislação do IPI e do imposto de renda da pessoa jurídica.

Veja-se precedente relevante para a compreensão do que foi afirmado anteriormente:

TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃOCUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015).

  1. Para efeito do creditamento relativo às contribuições denominadas PIS e COFINS, a definição restritiva da compreensão de insumo, proposta na IN 247/2002 e na IN 404/2004, ambas da SRF, efetivamente desrespeita o comando contido no art. 3o., II, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que contém rol exemplificativo.
  2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.
  3. Recurso Especial representativo da controvérsia parcialmente conhecido e, nesta extensão, parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que se aprecie, em cotejo com o objeto social da empresa, a possibilidade de dedução dos créditos relativos a custo e despesas com: água, combustíveis e lubrificantes, materiais e exames laboratoriais, materiais de limpeza e equipamentos de proteção individual-EPI.
  4. Sob o rito do art. 543C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte. (Resp n.º 1.221.170 PR (2010/02091150), Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho).

Conforme se verifica, o conceito adotado pelo STJ, baseado na essencialidade e relevância é de importante abrangência, não incluindo conceitos contábeis, de maneira que a modalidade de creditamento sobre a aquisição de insumos deve ser vista como regra geral de apuração de créditos para atividades de produção de bens e prestação de serviços, sem prejuízo das hipóteses previstas em lei.

Por fim, é relevante o Acórdão n° 3201-007.345 do Carf, que ilustra exatamente a questão da definição do conceito de insumos à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, que decidiu que despesas consideradas como essenciais e relevantes, desde que incorridas no processo produtivo da contribuinte, geram créditos PIS e Cofins no regime não cumulativo.

Isso tudo confirma o direito do contribuinte ao ressarcimento e à utilização dos créditos em compensações.

 

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